quinta-feira, fevereiro 19, 2015

O vento levou….

A tela do cinema encheu-se com os seus corpos num abraço.
Os meus olhos bebiam cada movimento. Sentado no escuro da sala improvisada olhava pasmado para os corpos juntos. Num misto de vergonha e excitação, ritmo cardíaco acelerado, do alto dos meus 11 anos, via o meu primeiro beijo de cinema.
Lembro-me, passados já 63 anos, como se fosse agora.
A Vivien Leigh, no seu vestido comprido, a ser tomada nos braços por um Clark Gable charmoso e imponente.
Não sabia os seus nomes, nem tão pouco o que diziam. Mas o que senti foi tão intenso que recordo ainda hoje.
O meu corpo vibrava, vivia emoções que eu desconhecia até então, sentia-me comovido, a música preenchia-me, e parecia sentir o vento, o calor e o horror de uma guerra de que eu já tinha ouvido falar. Era como se estivesse sozinho na sala, mergulhado na tela.
E havia os decotes... o peito alvo, os ombros nus, nunca tinha visto uma mulher de pele tão branca. Parecia tão macia, como o veludo da fita do chapéu da tia Adelaide, que era a coisa mais macia que eu conhecia. Ainda hoje me intriga o porque fui eu lembrar-me da tia Adelaide naquela altura.

Aquele abraço ficou gravado na minha memória e imitei-o vezes sem conta. Valeu-me mais tarde a alcunha de Gable, e emprestava-me confiança quando me aproximava cauteloso de uma mulher.
Hoje passado estes anos todos, e tantos abraços, reencontro-me com a mesma cena, antevejo com expectativa o beijo que vai acontecer e por breves momentos volto a ter 11 anos, e deixo-me inebriar mais uma vez pelos dois corpos juntos num abraço.

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