sábado, dezembro 23, 2017

Na grande clareira.

Foto da Boop - vale do Douro - hoje

Há muito, muito tempo, tanto que já ninguém sabe ao certo o tempo exacto, contava-se que por alturas do solstício de inverno uma bruma mágica cobria todo a vale, ocultando de todos os olhares, o percurso do rio.
Esse era um dia estranhamente silencioso. Parecia que o nevoeiro absorvia todos os sons, os cães não latiam, o vento não assobiava, ficava o mundo como que em suspenso.
Em algumas casas, sabia-se, havia homens, que sem dizerem palavra, arrumavam na sacola um mata bicho, e sem acordarem ninguém, saiam de casa, desciam a encosta e embrenhavam-se na espessa neblina.
Era com dificuldade que encontravam o carreiro que levava à grande clareira. Viam pouco mais do que espaço entre um pé e outro a cada passo. Era por isso lento o caminho. E embora todos soubessem que outros fariam o mesmo percurso, na verdade nunca encontravam ninguém. Era uma viagem solitária em que se preparavam para o verdadeiro encontro.
No centro da grande clareira crescia um carvalho. Era uma árvore secular, com um tronco tão largo que eram precisos 11 homens para o abraçar. Exemplar único e extraordinário, criava um ambiente algo encantador em qualquer dia do ano, e não era raro servir de abrigo, do sol ou da chuva, a caminhantes, pastores, estafetas ou namorados. Também se contava que feiticeiros, bruxos, magos, macumbeiros e adivinhos, por aqui passavam e recolhiam folhas, seiva, e até a terra e o musgo que crescia nas grandes raízes, onde as crianças brincavam.
Mas neste dia revelava toda a sua magia.
Aqueles que lá chegassem, encontrando o caminho pelo meio da névoa, e se viessem de coração aberto (que a magia da floresta pouco se importa com as regras morais dos homens, ou com o que consideram puro ou digno de recompensa) podiam formular, perante o majestoso Carvalho, o seu mais secreto desejo de mudança. E sabia-se que voltariam a casa homens novos, e que nos seus rostos trariam a calma e a serenidade daqueles que nada devem e nada temem. E por isso parecia que os seus lares ficavam mais iluminados, como se uma estrela por eles velasse.

Tenho para mim que esta história foi inventada por uma qualquer mãe, numa manhã de silenciador nevoeiro, para sossegar os filhos inquietos com a misteriosa névoa. E que na sua ingénua sabedoria intuiu que é nos caminhos morosos e incertos que se produzem verdadeiras mudanças.

Votos de boas festas, pagãs ou cristãs.


4 comentários:

  1. Como gosto tanto de lendas e esta está maravilhosa. Boas festas e agora vou fazer os meus sonhos e mais logo ir para a enorme alegria e gritaria dos meus e sobretudo dos netos.

    Beijos amiga extensíveis aos teus

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  2. Boas festas, querida Boop! Feliz Natal :)

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  3. Fatyly, serviu esta lenda para resgatar em mim algum espírito natalicio!!
    :)
    Bjs

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  4. Boas festas Caliope!!!!
    Aproveita Lisboa!
    :)

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