terça-feira, dezembro 04, 2007

A espera



Isabel levantou-se cedo,
Talvez fosse hoje. Talvez o Sr Marcolino trouxesse lá no meio das outras cartas, contas e encomendas a resposta dele!
Coisa tonta esta da Isabel, de se arranjar com mais primor no dia em que pressentia que o Sr Marcolino ia trazer uma carta do José. Lavava a cara com a água fria do fim do Outono, penteava os cabelos negros e prendia-os atrás com uma fita de veludo vermelha que ele lhe tinha dado no dia do baile da Sra da Anunciação, passava uma gotas do perfume caro no pescoço e vestia o casaco domingueiro.
E enquanto se ocupava com os seus afazeres ia espreitando a curva do caminho, imaginando vezes sem conta que ouvia a campainha da bicicleta do Sr Marcolino que deixava as encomendas na loja da D Maria.
Que inquietação esta que tomava conta dela, lembrava na sua cabeça as palavras que tinha escrito com a sua letra bem desenhada, palavras escolhidas com cuidado, frases que antecipavam os olhos dele presos no papel, bebendo cada silaba com se fossem beijos dela.
Talvez fosse hoje.
Largou o que fazia e foi buscar o jarro de água. Encheu um copo e foi sentar-se à porta, bebendo lentamente e olhando a curva do caminho...
Estava bonita, o cabelo preto brilhava à luz do sol de Outono, mas mais do que esse sobressaia o brilho dos olhos verdes, hoje especial, hoje cheio de esperança.
Agora sim. Tinha a certeza de ter ouvido a campainha da bicicleta. Imaginou a cena: A D Maria a abrir a porta, a dar os bons dias ao Sr Marcolino, a receber das suas mãos as poucas encomendas que nesta altura do ano costumavam chegar. Lembrou-se impacientemente do copo de água que tão gentilmente a lojista oferecia cada dia ao carteiro, não fosse a sua pressa tinha sorrido perante a ideia de sempre arranjarem um pretexto para se demorarem mais um pouco um ao pé do outro. E o Sr Marcolino sorria, dizia até à manhã e... aparecia na curva do caminho.
Lá estava ele.
Chegava ao pé dela. Parou!
O coração bateu mais forte, mal se contendo com a expectativa. Era uma carta que ele procurava na sacola e que lhe entregava ela.
Mas a carta não era do José!
E os olhos perderam o brilho...
Talvez amanhã...


31 comentários:

  1. Gosto da photo.

    O conto é lindissimo, leva-me a outros dias que ainda são os de hoje noutros locais.
    Saudades fotograficas do Portugal saloio.
    Nós devemos ser dos póvos com maior tendencia para belas mulheres esperando amores distantes, está-nos na alma.

    Beijo grande de quem adorou a viagem.

    (O teu "Talvez amanha..." é que me relança as duvidas... falso alarme?)

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  2. Nada falso o alarme...
    ;)

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  3. boop, a isabel padece, como qualquer mocinha enamorada, de um sexto sentido ansioso, não é?? e provavelmente com razão acrescida. estaria o seu zé no ultramar?? andamos obcecados com o vintage e daí a associação pré abrilesca.
    de todo o modo, os correios sempre funcionaram como uma bela desculpa para a falta de notícias. hoje já não temos essa sorte quando "o zé" não dá sinal...

    continua com estas prosas!!!
    fico em pulgas para saber do sr marcolino e das missivas que trará amanhã.

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  4. ... sempre o "talvez amanhã"... que angústia. Os pormenores da história são deliciosos. Bj

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  5. pois, não quero estragar a estória, mas soube agora que José morreu...
    ora bolas, Boop... diz a ela que o funeral é amanhã pelas 17h na capela da anunciação...

    yayayay
    estou-me a rir porque 17h não é hora para enterrar ninguém...

    yayay

    abrazo europeo

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  6. mna boop, por que é que agoras apareces de luto?? morreu mesmo o josézito, como o mixtu tinha dito??

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  7. Uma espera sempre actual num belo conto!

    Beijos

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  8. Sempre a trazer-nos sorrisos... mesmo q nostálgicos!...
    Mais uma vez: Parabéns!
    Tb pelo resto!

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  9. Linda... Tu és uma verdadeira "storyteller". Acende ai a fogueira e conta mais... Adoro os teus contos!

    Beijos

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  10. os olhos perderam o brilho?

    agora que brilhas por todos os lados???

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  11. A questão é que o Sr.Marcolino volta sempre amanhã....

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  12. No dia seguinte, Isabel acordou com esperança agonizante do "talvez", a meio vestir. Olhou a fita vermelha estática, berrante e muda ao mesmo tempo. Ali, no mesmo sitio onde a pousara ontem.
    Os minutos empurraram-se lentamente uns aos outros e lá na hora do costume apareceu o Sr. Marcolino a dobrar a estrada de luz cinzenta.
    Isabel saiu já com o copo de água na mão. Mesmo sem misivas, sabia que o Sr. Marcolino tinha aquela sede contínua. A regra do hábito.
    La saiu a seu encontro. Ele parou frente à porta, abriu a velha pasta e tirou um envelope.
    Sorriu ao ver o espanto na cara da moça. No mais natural dos movimentos ela arrebatou-lhe das mãos a missiva
    ...não era a que estava à espera, possivelmente aquelas letras não mereciam uma recepção em atavios domingueiros nem fitas vermelhas a segurar seus preciosos cabelos, mas devolveu um sorriso ao Sr. Marcolino que já tinha apagado a sede. Tornou a ver o envelope com um certo encanto na face. No lugar do remetente estava escrito:
    "Blf Blf Blf!"

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  13. ...
    LINDO!!!

    e decerto fica muito melhor servida com o manél-d!!

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  14. detesto suspenses...


    ps : parabens.

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  15. Off Topic
    Estás bem sentada?
    Precisas de uma almofada?
    Manta?...
    Apetece-te um sumo?
    Lanche?
    Não forces os olhos!
    Descansa a cabeça!
    Sentes-te bem?
    De certeza?...
    :)
    Fico felicissimo por ti (por vocês) miuda.

    Beijo muitA grande, cheio de orgulho!!

    Outro Off Topic e ainda por cima um Copy Paste:

    Claro que também vale para os homens, o problema é que os homens portugueses são MUITO MAIS FEIOS que as mulheres portuguesas, o que vos (mulheres) obriga a uma maior tolerância às supostas imperfeições nas quais se descobre tanto charme, tanta tesão.

    E já agora, outro beijo muitA grande *

    Muy cool :)))))

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  16. Não pude deixar de sorrir ao ler este belo texto/conto, pois vieram-me à memória coisas minhas de outros tempos já quase esquecidos, lá bem no fundo das minhas lembranças mais remotas de um princípio de Primavera florida.
    O primeiro não se chamava Marcolino, mas sim Alberto... e o segundo... esse não era José, mas sim, Florentino...

    Gostei muito!

    Beijo

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  17. Vim ali do canto do Dias Lamecha, e sublinho que quando o adjectivo é com carinho, sou um apaixonado do rapaz.

    E sobre essa coisa do Zé, não faças caso, os homens são mesmo assim.
    Por essas e por outras é que sou mais dado a Zézinhas.

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  18. Gosto do puxador da porta!
    Ah, o buraco também me agrada.

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  19. Velho intriguento, vens aqui dizer que és apaixonado do Dias? Isso era um segredo de camarote, não era para dizer!

    PORRA! És sempre o mesmo!

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  20. Duh, já estás aqui?
    Velho, como eu queria ver-me livre de ti.
    Vou fazer rifas e rifar-te!

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  21. Ai velho do caraças!
    Nem te dês ao trabalho... saio de cetteza à casa, que é como quem diz, ao camarote...
    Achas que conseguias vender alguma rifa com esse aspecto naftalinado?

    Enxerga.te velho!

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  22. Olha-te ao espelho, repara que nem reflexo tens, apenas és o que eu permito.

    Vou jantar que as meninas da segurança social já chegaram.

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  23. Quase podia mudar o meu nome para Isabel...fiseste-me lembrar as esperas intermináveis por respostas que mais tarde ou mais cedo acabavam por chegar...
    Ansiedade que deixei, algures no caminho...a ansiar sozinha.=)

    3 bjinhos e meio*

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  24. E não é a nossa vida uma constante espera?!

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  25. Ó velho, gostei das meninas, eram jeitosas, só foi pena virem vestidas!

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  26. ...
    ena! temos marretas por aqui!!!


    mna. boop, já estamos fartos de esperar...
    afinal quando chega o godot ou a carta dele?? ou será que a moça se encantou pelo manél-d e acabou-se a história??

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  27. quem espera sempre alcança... olha lá... esperei todo o ano pelo natal, e aí está ele quase a chegar...

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  28. Ola...

    Lindo e emocionante conto...
    A carta chegará...talvez amanhã ou em outro dia... mas chegará, porque a Isabel assim acredita e assim se prepara diariamente para a receber... tal como se preparará para receber o seu José...

    Beijo
    Vity

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